O número de registros de roubo de carga no Brasil caíram em 2024 na comparação com 2023. Porém, os prejuízos gerados por esse tipo de crime cresceram. Segundo especialistas, quadrilhas cada vez mais ousadas estruturam operações sofisticadas, focam mercadorias de alto valor agregado. São cargas como medicamentos, eletrônicos e cigarros, por exemplo.
Dessa forma, a conclusão é de que o crime deixou de ser pulverizado e ganhou planejamento. Ou seja, não se trata apenas de quadrilhas armadas em beiras de estrada. Atualmente, organizações criminosas analisam dados, estudam rotas e miram os trechos mais rentáveis. Bem como focam os eixos que ligam os centros de distribuição aos portos de entrega.
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Segundo o diretor de negócios da ICTS Security, Anderson Hoelbriegel, essa mudança explica por que os prejuízos cresceram havendo menos ocorrências. “O criminoso também faz análise de risco, acompanha sazonalidades e age em períodos de maior movimentação, como Natal e Black Friday, por exemplo”, afirma o executivo da empresa de consultoria e gestão de segurança.
Ousadia das quadrilhas de roubo de carga
Assim, segundo ele, o combate a esse tipo de crime exige mais estrutura. Afinal, muitos criminosos demonstram ter conhecimento técnico. Eles sabem dirigir caminhões pesados, usam veículos de apoio para desatrelar carretas e até retroescavadeiras. Além disso, adulteram documentos digitais, exploram brechas em sistemas e buscam informações em redes sociais e na internet.

De acordo com Hoelbriegel, a maior fonte de risco está ligada ao fator humano. “O pilar mais vulnerável ainda é o das pessoas. É ali que ocorre o aliciamento de motoristas e ajudantes, ou a infiltração em transportadoras. A tecnologia ajuda, mas não funciona sozinha. É preciso haver processos sólidos e treinamento”, diz.
Inteligência e tecnologia como resposta
Para enfrentar esse nível de organização, empresas recorrem a quatro pilares de defesa: tecnologia, processos, inteligência e pessoas. Além disso, o diretor da ICTS defende o conceito das três linhas de proteção: gerenciadora de risco, torre de controle e consultoria estratégica.
O uso de dados e relatórios de ocorrências tornou-se ainda mais importante. Caso não conte com registros detalhados de roubo de carga por região, horário, via e perfil de motorista, o embarcador opera às cegas. Dessa forma, ele defende o uso da inteligência em gestão para identificar padrões e prevenir ataques.
“O motorista bem treinado já evitou vários roubos. Ele percebe a anomalia comportamental na estrada. rapidamente, aciona a central e o veículo é bloqueado antes de entrar em áreas de influência do crime”, diz Hoelbriegel. Ele explica que esse comportamento requer certa frieza, assim como discrição.
Integração público-privada é crucial pra reduzir roubo de carga
Entretanto, o especialista reforça que a iniciativa privada não consegue combater o problema sozinha. Nesse sentido, ele lembra o caso de uma operação contra roubo de combustíveis na Baixada Fluminense, apoiada pela Transpetro. O que resultou na incidência de casos na região. Vale lembrar que é preciso envolver sempre os órgãos de segurança pública.
Além disso, experiências locais, como o programa Caminhoneiro Seguro, no Paraná, e ações na Baixada Santista, em São Paulo, reduziram índices de ocorrências. Para isso, houve repressão feita de forma articulada entre a polícia e as empresas do setor.
Inteligência artificial pode ser oportunidade ou risco
A inteligência artificial surge como aliada para análises preditivas, mas também representa risco se mal utilizada. Nesse sentido, criminosos já exploram ferramentas digitais para adulterar documentos, como placa de caminhões e CNH de motoristas, e planejar ações.
As quadrilhas atuam sobretudo em horários noturnos e madrugadas, aproveitando a menor vigilância policial. Ademais, a fragilidade das rodovias federais, com baixa capilaridade da PRF, favorece a ação criminosa. O fenômeno ganhou força após a pandemia, com a explosão do e-commerce e dos centros logísticos. “As rodovias federais se tornaram os maiores eixos logísticos do País, e por isso os mais visados”, destaca Hoelbriegel.
Dados da pesquisa: menos ocorrências, mais perdas
Seja como for, a pesquisa de 2024 mostra que o Brasil registrou 10.478 casos de roubo de carga. Ou seja, queda de 11% em relação ao ano anterior. Entretanto, o prejuízo financeiro aumentou 21%. O Sudeste é a região mais impactada, respondendo por 83,6% das perdas, com São Paulo concentrando mais de 70%.
Além disso, o Nordeste avançou de 8,3% para 11,7% do total, enquanto o Sul caiu para 2%. Os dados confirmam que o crime se tornou mais seletivo e ousado. Com foco em cargas de maior valor agregado. Com isso, cada ataque pesa mais no bolso do transportador e do embarcador, sendo repassado ao consumidor final.