O Brasil vive uma das fases mais críticas da história recente do transporte rodoviário, com risco real de apagão logístico devido à falta de caminhoneiros. Embora o setor movimente mais de 60% de todas as cargas do País, o número de profissionais diminuiu de forma acelerada na última década.
Segundo a Senatran, o Brasil perdeu 1,1 milhão de caminhoneiros entre 2013 e 2023, o que representa uma redução de 20%. Além disso, pesquisas mostram envelhecimento acelerado da categoria, queda no interesse dos jovens e evasão crescente entre autônomos.
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Esse conjunto de fatores coloca pressão inédita sobre transportadoras, embarcadores e toda a cadeia logística. O desinteresse dos jovens pela profissão, somado ao cansaço de quem já está perto da aposentadoria, enfraquece a capacidade operacional das empresas. Dessa forma, elas já enfrentam dificuldade até para preencher vagas básicas.
Ao mesmo tempo, especialistas alertam que a precariedade estrutural, o baixo reconhecimento social e a falta de políticas de formação afastam novos talentos. Assim, o Brasil corre o risco de conviver com gargalos cada vez mais severos no abastecimento.
Força de trabalho encolhe e setor teme aposentadorias em massa
Nesse sentido, a pesquisa mais recente da CNT (Confederação Nacional do Transporte) reforça a gravidade do cenário. Ou seja, 26,9% dos caminhoneiros brasileiros estão na faixa de 40 a 49 anos. Além disso, uma fatia expressiva já ultrapassou os 50 anos, o que indica uma janela estreita para renovação. Enquanto isso, jovens demonstram pouco interesse pela boleia, sobretudo pela baixa atratividade financeira e pela ausência de boas condições de descanso nas rodovias.
O problema se agrava entre os autônomos. A CNTA estima que mais de 37% deles deixarão a profissão até 2026. Sobretudo, por causa dos custos altos, da instabilidade de fretes e das longas jornadas que comprometem a saúde física e mental.
Entretanto, a escassez não se limita aos caminhões pesados. Até mesmo os cegonheiros, considerados a elite da categoria, relatam dificuldade para renovar quadros. Isso ocorre porque a rotina exige muito mais do que habilitação. Ou seja, envolve leitura precisa de rotas urbanas, embarque e desembarque seguros e postura profissional diante das concessionárias.
Antigamente, esses profissionais aprendiam diretamente com veteranos durante meses. Hoje, porém, o custo dessa formação inviabiliza o modelo tradicional, o que reduz ainda mais a oferta de mão de obra.
Setor aposta em tecnologia e qualificação para atrair novos caminhoneiros
A indústria e as entidades representativas concordam que não haverá solução rápida sem investimento estruturado em capacitação. Assim, programas de formação, parcerias entre transportadoras e autoescolas e incentivos para obtenção da CNH profissional se tornam essenciais.
Além disso, a renovação da frota aparece como estratégia para melhorar a atratividade da profissão. Caminhões equipados com tecnologia embarcada, maior conforto e assistentes de segurança tendem a reduzir o desgaste físico, aumentar a eficiência e tornar o trabalho mais profissional.
Enquanto isso, transportadoras reforçam que melhores condições de trabalho serão decisivas para impedir a fuga de profissionais. E isso inclui remuneração adequada, locais dignos de descanso e programas de bem-estar.
Europa enfrenta rejeição crescente à profissão e imagem deteriorada

A crise brasileira ecoa em outros mercados globais. Na Europa, o Truck Driver Barometer 2024, elaborado pela IRU em parceria com a Michelin, revela uma percepção extremamente negativa da profissão. O continente registra uma rejeição média de -43, o que indica forte rejeição à carreira.
Países como Espanha (-76), Polônia (-59) e Itália (-48) apresentam índices ainda mais críticos. Mesmo mercados tradicionalmente organizados, como Alemanha (-31), Holanda (-26) e Reino Unido (-25), têm avaliação desfavorável.
Apesar disso, 81% dos motoristas dizem gostar do trabalho em si. O que demonstra que o problema está nas condições oferecidas, e não na atividade de conduzir caminhões.
Falta de estacionamento e tratamento inadequado lideram reclamações
Os principais motivos de insatisfação são estruturais. Conforme a pesquisa, motoristas apontam é falta de infraestrutura com estacionamentos seguro, tratamento desrespeitoso em docas e imagem social negativa.
Esses fatores, citados por mais de 80% dos entrevistados, comprometem a segurança, elevam o estresse e reduzem a atratividade da profissão. Além disso, o envelhecimento da força de trabalho preocupa: 25% têm mais de 55 anos, enquanto apenas 4% têm menos de 25.
Alemanha combina escassez de caminhoneiros, economia fraca
A Alemanha vive uma equação ainda mais delicada. A economia cresce de forma tímida, apenas 0,3% no terceiro trimestre de 2025. E a confiança empresarial segue baixa. Assim, a demanda por transporte se mantém instável.
A falta de motoristas provoca um efeito duplo: reduz a capacidade operacional e eleva custos. Para reter profissionais, empresas aumentam salários, que subiram 3,7% em 12 meses, ritmo superior ao reajuste dos fretes.
Assim, mesmo com estabilidade no preço do diesel, dos veículos e do armazenamento, a mão de obra se transformou no principal custo da logística alemã.
Sem motorista, não há logística: Brasil e mundo precisam agir
A escassez de motoristas deixou de ser tendência e se tornou realidade urgente no Brasil e em outros mercados desenvolvidos. A combinação entre envelhecimento da categoria, baixa atratividade da profissão, falta de infraestrutura e condições inadequadas de trabalho cria um círculo vicioso que afeta empresas, embarcadores e toda a sociedade.
Ações que especialistas julgam necessárias para a renovação de caminhoneiros
- melhoria das condições de descanso;
- valorização financeira;
- acesso facilitado à formação;
- campanhas de reconhecimento social;
- renovação da frota