Desde sexta-feira (8), cerca de 400 veículos estão parados na Cordilheira dos Andes, entre o Chile e a Argentina. Todos estão impedidos de sair e não podem ser resgatados por causa das constantes nevascas que vêm caindo na região. O brasileiro Deomar Antonelo é caminhoneiro e está preso no topo da montanha. Ele trabalha na ABC Cargas e relatou seu drama ao Estradão.
Antonelo é de Curitiba (PR) e conta que ficou retido logo que a nevasca começou a cair. Ele diz que seu caminhão estava quase na divisa da Argentina com o Chile. Assim, tão logo a primeira tempestade deu trégua e o Exército chileno limpou a estrada, ele imaginou que poderia seguir viagem. Porém, não foi isso que aconteceu.
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Segundo o caminhoneiro, novas tempestades de neve começaram a cair sobre a região. Assim, tanto ele quanto outros motoristas foram impedidos de deixar o local. De acordo com o curitibano, uma fila com centenas de veículos de vários tipos se formou na estrada. "Foram horas de terror. É muito assustador porque a neve chegou a 1,40 metro de altura. Faço essa rota desde 2015. Mas nunca vi uma situação dessas", diz Antonelo.
Temperaturas chegam a menos 20 graus
Apesar de o caminhão ter ficado preso por apenas algumas horas, o motorista diz que vários sistemas congelaram. Portanto, quando isso ocorre não é recomendável dar a partida no motor. Segundo Antonelo, há risco de sérios danos a componentes como o motor, por exemplo.
Além disso, ele conta que não dá para ligar o aquecedor do caminhão. "Nessa época do ano, sobretudo entre julho e agosto, quando o inverno é mais rigoroso, costumo usar roupas com proteção térmica. Mas mesmo assim, é terrível ficar a quase menos 20 graus".
Risco de acidente
De acordo com o caminhoneiro, mesmo que a neve seja menos intensa, é muito perigoso circular pelas estradas da Cordilheira. "Na tentativa de escapar da nevasca, alguns motoristas acabaram causando acidentes na montanha. Recentemente, fecharam a estrada porque uma carreta patinou e fez o 'L'".
Ou seja, sob neve, todo cuidado é pouco, segundo o caminhoneiro. Ele conta que o caminhão pode patinar mesmo se o freio motor estiver acionado. A gente tem que andar em baixíssima velocidade. E sempre em comboio", diz. Antonelo transporta dois cavalos-mecânicos, totalizando 38 toneladas de peso bruto total combinado (PBTC).
Até o fechamento desta reportagem, ele continuava parado no pátio da ABC Cargas, em Los Andes, próximo à Cordilheira. Segundo Antonelo, o tempo ainda estava ruim para seguir viagem. "Porém, aqui temos uma boa estrutura. Estamos aquecidos e dá para cozinhar. Tenho conversado com colegas e alguns foram resgatados. Eles tiveram de deixar os caminhões na estrada e estão na base do Exército."
Acidentes dificultam resgate
De acordo com o coordenador de operações da transportadora SVD Transportes, Emerson Prestes, há pelo menos 20 anos não acontece uma nevasca tão forte na região. O especialista trabalha em São Borja, na divisa do Brasil com a Argentina.
"Geralmente, os governos argentino e chileno fecham a Cordilheira dos Andes quando há previsão de nevasca forte", explica Prestes. De acordo com ele, é preciso monitorar tanto as mudanças no clima quanto o trânsito o tempo todo. "Afinal, o fluxo de veículos pesados na região é intenso."
Porém, um acidente com caminhões no acesso à Cordilheira, do lado da Argentina, impossibilitou o fechamento da via antes da nevasca. Além disso, as autoridades foram surpreendidas por mudanças bruscas nas condições climáticas. A previsão era de que a tempestade de neve, que caiu na sexta-feira (8) só chegasse no sábado (9).
À espera da melhora
Assim, várias empresas contabilizam prejuízos. A SVD, que transporta caminhões e máquinas agrícolas do Brasil para outros países do Mercosul, não tem nenhum motorista preso na Cordilheira. Porém, 63 caminhoneiros estão parados nas fronteiras de Brasil, Argentina e Chile aguardando que o clima melhore para seguirem viagem.
Além disso, a transportadora tem de pagar as diária de seus 84 veículos que estão estacionados nos pátios das aduanas. Segundo o diretor de operações do Grupo SVD, Sergio Pzichoz, isso impacta toda a cadeia do negócio. "Estamos com caminhões parados em vários dos nossos pátios", afirma.
Da mesma forma, 50 motoristas da ABC Cargas continuam parados na região das Cordilheiras. Todos estão levando caminhões para outros países do Mercosul. Geralmente, eles dirigem os cavalos-mecânicos até as concessionárias das marcas nesses locais.
FalhasSem previsibilidade
De acordo com o o diretor-presidente da ABC Cargas, Danilo Guedes, as nevascas são comuns nesta época do ano. Porém, segundo ele, as tempestades têm ficado mais intensas. "Geralmente, a Cordilheira não fica fechada por mais do que três dias. Mas desta vez não foi possível prever o que aconteceria".
Seja como for, ele conta que o problema só não foi maior porque as autoridades chilenas agiram rapidamente. "Foi possível resgatar todas as pessoas que estavam presas", diz. Contudo, Guedes afirma que a liberação das pistas deve demorar a ocorrer. Ele lembra que há veículos abandonados nas vias.
"É preciso aguardar a nevasca passar. Porém, há previsão de novas tempestades a caminho". afirma. De acordo com ele, só depois que o Exército subir a montanha e limpar a neve será possível liberar esses veículos. Mas muitos estão congelados. "Teremos de guinchar vários deles", diz.
Conforme o executivo, é complicado repassar os custos extras desses imprevistos aos clientes. Porém, ele afirma que sempre tenta fazer possíveis acordos para que a empresa não tenha de arcar com 100% do prejuízo. Guedes conta que a ABC Cargas tem cerca de 130 caminhões parados apenas na fronteira entre o Brasil e a Argentina.