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Ônibus rodoviários a gás: o que muda para o passageiro e o operador?

Com desempenho semelhante ao diesel, ônibus rodoviários a gás oferecem menores emissões, mais conforto e redução de custos

Thiago Vinholes

17 de jun, 2025 · 11 minutos de leitura.

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Scania, ônibus a gás, Viação Santa Cruz
Ônibus rodoviário a gás da Scania tem alcance de até 650 km
Crédito:Scania/Divulgação

O uso de gás natural veicular (GNV) e biometano como combustível para veículos pesados ainda é incipiente no Brasil, mas começa a ganhar espaço em segmentos como o transporte urbano e a logística de curta e média distância. Nos últimos anos, caminhões e ônibus urbanos movidos a gás passaram a ser testados e introduzidos em pequenas frotas no País como alternativa mais limpa aos modelos a diesel. Apesar do estágio inicial, as operações dos veículos desse tipo e o abastecimento têm ocorrido sem dificuldades, com apoio da infraestrutura já existente em rodovias e centros urbanos.

O debate agora avança para outra etapa: o transporte rodoviário de passageiros em rotas de médio e longo alcance. A adoção de motores a gás em ônibus rodoviários ainda é rara no Brasil. Atualmente, há apenas um único veículo desse tipo em operação no país: um modelo com carroceria Marcopolo G8 e chassi Scania K340 4x2, que está em fase de testes com a Viação Santa Cruz, na rota entre São Paulo e Campinas.

Os motores a gás, sobretudo abastecidos com biometano, obtido de fontes renováveis, oferecem uma redução de emissões de CO₂ que pode passar de 90% comparado aos efeitos do diesel, de acordo com dados da Scania. Além disso, a queima do gás gera menos material particulado e óxidos de nitrogênio (NOx), gases que causam doenças respiratórias. Mas é possível viajar longas distâncias com esse combustível no Brasil? Fabricantes de ônibus e fornecedores de gás afirmam que sim.

Rede de gás atual já sustenta rotas curtas e médias

A infraestrutura de abastecimento já permite o uso do gás em frotas de caminhões e ônibus em operação regular. No entanto, essa disponibilidade ainda está concentrada nas regiões Sul e Sudeste, onde o fornecimento de GNV e biometano é mais estável e acessível. Embora a adesão do combustível não tenha abrangência nacional, é justamente nessas áreas que circula a maior parte da carga e dos passageiros transportados por veículos pesados no Brasil.

Por exemplo, no trecho entre São Paulo e Campinas, onde a Viação Santa Cruz testará o ônibus a gás da Scania, funcionam seis postos de abastecimento de GNV e biometano. "Esse é o único ônibus da nossa frota que vamos abastecer fora da garagem', contou Francisco Mazon, proprietário da empresa, em entrevista ao Estradão. Nas demais operações, a empresa usa bombas de diesel instaladas em suas próprias bases.


Normalmente, empresas com grandes frotas abastecem os ônibus em garagens próprias. Migrando para o gás, também é possível montar estações de abastecimento em bases. A Comgás é um dos fornecedores dessa solução.

“O transporte pesado é hoje a grande oportunidade de crescimento do uso do gás e da difusão desse energético”, afirmou Henrique Sonja Penha, gerente executivo de vendas da Comgás, durante a apresentação do ônibus de teste da Santa Cruz. Atualmente, apenas na região metropolitana de São Paulo, mais de 240 postos de combustível estão ligados à rede de gás da companhia. Além disso, Penha afirmou que a empresa planeja ligar mais de 70 garagens e 20 novos postos nos próximos anos.

Além da rede bem disseminada em São Paulo, há postos de gás para veículos pesados em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Paraná. Também existem iniciativas em outros estados, mas ainda com infraestrutura muito restrita para caminhões e ônibus.

Ônibus a gás é mais caro, mas o combustível mais barato

Atualmente, o investimento inicial em ônibus rodoviários a gás ainda é 20% a 30% mais alto do que nos modelos a diesel. No entanto, essa diferença tende a ser compensada ao longo do tempo, graças ao custo operacional mais baixo do gás, especialmente em frotas que percorrem longas distâncias ou operam com alta frequência.

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Os cilindros de gás ficam em compartimentos localizados atrás das rodas dianteiras - Scania/Divulgação

Segundo dados da Scania e distribuidoras como Comgás e Compagas, o abastecimento com gás natural veicular (GNV) ou biometano pode reduzir em 30% a 40% o custo por quilômetro rodado em relação ao diesel. Isso ocorre porque, apesar de o motor a gás ter um rendimento levemente inferior — cerca de 10% a menos —, o preço por metro cúbico de gás é mais competitivo. Em média, o GNV custa entre R$ 3,00 e R$ 4,00/m³, enquanto o diesel varia entre R$ 5,00 e R$ 6,00/litro, dependendo da região.

Além disso, o motor a gás exige menos manutenção. Por operar com combustão mais limpa, gera menor desgaste de componentes internos e reduz a necessidade de trocas frequentes de óleo e filtros. Estimativas da indústria indicam que a manutenção pode custar até 30% menos em comparação com um modelo equivalente a diesel.

A autonomia dos ônibus rodoviários a gás pode variar, mas permanece na mesma faixa dos modelos a diesel. O modelo da Scania, por exemplo, alcança entre 200 e 650 quilômetros. “A autonomia é personalizável e depende da quantidade de cilindros de gás instalada, conforme a necessidade de cada operador”, explicou Ivanovik Marx, gerente de Engenharia e Aplicação da Scania Operações Comerciais Brasil.

Silêncio no salão de passageiros

O motor a gás funciona em ciclo Otto, como os motores a gasolina. Isso significa que a ignição da mistura ar-combustível ocorre por centelha (vela), e não por compressão, como nos motores a diesel. Essa diferença resulta em uma queima mais suave e silenciosa, com menos vibração e ruído. Dessa forma, o salão de passageiros de um ônibus rodoviário com esse tipo de motorização é mais silencioso para os passageiros.

O ruído do ar condicionado, por exemplo, incomoda mais que o ronco baixo do motor. O veículo não emite o som áspero e constante típico de um motor a diesel. Em vez disso, soa como um motor a gasolina — embora mais alto, por causa da alta litragem do bloco.


Motor a gás, Scania, Marcopolo G8
O motor a gás torna o ônibus menos ruidoso - Scania/Divulgação

O ônibus rodoviário a gás da Scania tem motor cinco cilindros de 9 litros em duas configurações: uma com 284 cv de potência e 137 mkgf de torque e outra de 345 cv e 163 mkgf. Em ambas o câmbio é manual de 12 marchas com sistema retarder. A Santa Cruz escolheu a versão mais potente para o teste. Esse ônibus ainda é equipado com seis cilindros de gás, que rendem um alcance de 450 quilômetros.

Para Gustavo Cecchetto, gerente de Vendas e Soluções de Mobilidade da Scania no Brasil, o uso do biometano em ônibus rodoviários é viável e está em linha com a estratégia da empresa global da empresa. "Contribui para a redução de emissões, oferece custos competitivos em relação ao diesel e já conta com soluções técnicas maduras para operação. Hoje, o gás atende plenamente esses três pilares.”

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